28 de julho de 2025

O financiamento científico não pode estar refém de políticas inimigas da ciência – Educação – CartaCapital

O financiamento científico não pode estar refém de políticas inimigas da ciência – Educação – CartaCapital

A crise climática, as desigualdades sociais e os desafios globais de sustentabilidade demandam uma ciência mais transformadora, capaz de gerar impactos concretos na sociedade. Os mecanismos tradicionais de financiamento à ciência, entretanto, ainda estão fortemente enraizados em modelos disciplinares e competitivos, pouco propícios à  colaboração transdisciplinar e à experimentação necessárias para enfrentar esses desafios.

Nos EUA, a filantropia tem desempenhado um papel significativo na adaptação do financiamento científico para essa nova realidade. O contexto lá é também marcado por algo que a Nature destacou em um recente artigo: a incerteza gerada por congelamentos de financiamento impacta milhares de pesquisadores e instituições, criando um cenário de turbulência nas universidades e agências federais a partir das primeiras ações do novo governo Trump. Além disso, milhões de beneficiários de programas financiados pelos EUA  em todo o mundo foram deixados sem suporte, afetando o ecossistema global de pesquisa.  Um ataque à ciência em qualquer lugar é uma ameaça à ciência como um todo, por isso algumas organizações científicas internacionais começaram a reagir. Para que essa reação esteja à altura, são necessários sistemas de financiamento mais resilientes e flexíveis.

Um exemplo de articulação nesse sentido é a Vision for American Science & Technology  (VAST). A plataforma propõe um novo paradigma de apoio à ciência, impulsionando investimentos privados e estruturando redes de colaboração para garantir que a pesquisa não fique refém de mudanças governamentais abruptas.

A contemporaneidade demanda uma ciência que não apenas gere conhecimento, mas que contribua ativamente para a resolução de problemas globais. Nesse sentido, a UNESCO declarou esta como a década das ciências para o desenvolvimento sustentável. Essa abordagem exige um modelo de financiamento que vá além dos moldes tradicionais, incorporando elementos de pesquisa aplicada e coprodução de conhecimento com diferentes atores sociais.

No início deste mês, a UNESCO e o Conselho Internacional de Ciência (ISC) convocaram membros da comunidade internacional para o evento “Ciência Transformadora para o Desenvolvimento Sustentável”, que reuniu em Paris especialistas globais para discutir como a ciência pode enfrentar melhor os desafios da sustentabilidade. Durante dois dias de intensos debates, ficou claro que o modelo atual de financiamento da ciência precisa evoluir para apoiar pesquisas transdisciplinares e orientadas por missão, promovendo a coprodução do conhecimento – e que a filantropia tem um papel importante a cumprir.

Foram debatidas experiências de financiamento à ciência transdisciplinar e transformadora.  Entre os destaques, esteve o trabalho do Research on Research Institute (RoRI), que, por meio do projeto UNDISCIPLINED, investiga como agências de fomento podem estruturar editais que incentivem a transdisciplinaridade e maximizem o impacto social da ciência. O estudo destaca a necessidade de modelos flexíveis de financiamento, avaliação por painéis diversos e maior suporte às parcerias entre academia e sociedade.

Diante desse contexto, abre-se uma janela de oportunidade para a filantropia desempenhar um papel estratégico na transformação do financiamento científico. É necessário conectar a ciência com o setor filantrópico de maneira mais estruturada, criando pontes entre o fazer científico e as demandas sociais. Assim surgem oportunidades de estimular a ciência transdisciplinar e em coprodução com filantropias científicas tradicionais, ao passo que também há um campo fértil para articular filantropias que atuam historicamente em outros temas, como sistemas alimentares, inclusão produtiva, ação climática, e muitos outros, para  que financiem essa ciência transformadora.

A abordagem sugerida por diversas organizações, incluindo a Science Philanthropy Alliance, enfatiza que a filantropia pode apoiar iniciativas que combinam rigor científico com impacto social. Isso inclui desde a criação de fundos dedicados à ciência orientada por missões até o suporte a programas de capacitação que formem pesquisadores para atuar em contextos interdisciplinares. Se queremos que a ciência cumpra seu papel fundamental na construção de um futuro sustentável, seu financiamento precisa se alinhar a esse propósito. O evento da UNESCO e do ISC em Paris reforçou essa mensagem: o modelo atual de financiamento científico precisa evoluir para fomentar a transdisciplinaridade, a colaboração global e a inovação social.

Para isso, é essencial que espaços globais sejam utilizados como plataformas de articulação, promovendo diálogos entre diferentes atores e mobilizando novos modelos de financiamento científico. O envolvimento da filantropia nessa agenda pode ser decisivo para consolidar um ecossistema de apoio à ciência transformadora, que integre conhecimento, impacto social e inovação. Somente com essa convergência poderemos viabilizar soluções sustentáveis e de longo prazo para os desafios que enfrentamos.



Fonte ==> Casa Branca

Leia Também

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *