Diante das reivindicações de movimentos sociais em defesa do Parque Nacional de Brasília (PNB) e da Floresta Nacional de Brasília (Flona), o Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito civil público para apurar a regularidade do processo de concessão dos serviços de apoio à visitação promovido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
No dia 2 de abril, o ICMBio abriu uma consulta pública para ouvir a sociedade sobre a proposta de concessão, com previsão de realização de audiência pública no dia 7 de maio. Em resposta, quase 40 entidades socioambientais e frentes parlamentares da Câmara Legislativa do DF lançaram uma petição pública se opondo à continuidade do processo de concessão à iniciativa privada.
Entre os principais argumentos apresentados pela sociedade civil estão a ausência de participação popular no processo, a elaboração do projeto sem consulta às comunidades locais e aos usuários, além da fragilidade dos estudos apresentados. As entidades denunciam que os estudos desconsideram impactos das mudanças climáticas, riscos à segurança hídrica e ao patrimônio arqueológico. Também alertam para a ameaça ao caráter público e inclusivo dos parques, uma vez que a cobrança pelo acesso pode excluir grande parte da população.
“Foi uma surpresa muito negativa”, afirma o coordenador do Movimento Caminhos do Planalto Central, João Carlos Machado. “Há mais de 8 anos, centenas de pessoas das comunidades próximas da Flona, Ceilândia, Taguatinga e Sol Nascente, contribuem para a conservação da Flona, com a criação de trilhas e outros espaços de lazer, com todo o cuidado ambiental. Da mesma forma, a comunidade acabou de concluir um grande trabalho de revitalização e ampliação das trilhas do Parque Nacional de Brasília”, destaca.
Machado também considera injusta a política de cobrança de ingressos a população vulnerabilizada e acredita que com a concessão a situação possa se agravar. “A cobrança de ingressos que chegam a R$ 40,00 para que a população da periferia tenha acesso às trilhas para esporte e lazer é injusta e, no meu ponto de vista, beira o racismo ambiental.”
Os movimentos destacam na petição pública, os impactos sobre áreas comunitárias, como as trilhas da Flona, criadas por moradores de Taguatinga e Ceilândia, e os riscos à conservação ambiental e ao abastecimento de água. Defendem, por fim, a manutenção da gestão pública como forma de garantir o interesse social, a proteção da biodiversidade e a função das unidades como áreas de manancial.
“As Flona e o PNB são de grande importância para o lazer e o esporte, com impacto inestimável para a saúde e a qualidade de vida — que é um direito de toda a população”, ressalta o coordenador do movimento Caminhos do Planalto Central.
“Estabelecer uma concessão excludente como está proposto não pode ser decidido assim, sem diálogo. Por isso, o melhor caminho no momento é a suspensão do processo e a abertura de diálogo com a sociedade em busca de uma solução,” conclui Machado.
Inquérito MPF
Diante desse cenário, o MPF decidiu aprofundar a análise do processo de concessão e, no dia 10 de abril, requisitou ao presidente do ICMBio o envio de documentos e informações para a instrução do inquérito. Entre os dados solicitados estão:
- Cópia integral do processo administrativo e de todos os procedimentos correlatos à concessão, incluindo a consulta pública;
- Detalhamento dos meios utilizados para a divulgação da consulta pública, com indicação do nome dos veículos, local ou link, data de início da veiculação e cópias dos materiais (textos, áudios, vídeos e/ou imagens);
- Informações sobre eventuais estudos técnicos que embasaram a modelagem da concessão, com destaque para previsões de receita e despesa do futuro concessionário, além da estimativa de investimentos no Parque Nacional de Brasília.
O prazo para envio das informações é de 10 dias úteis.
Para Machado os argumentos econômicos que sustentam a proposta de concessão são frágeis. “A falta de recursos é grave, realmente preocupa. Mas concessão não irá resolver, veja que o edital estima um retorno irrisório de R$ 500 mil por ano para a conservação, fiscalização e outras funções das unidades. Por outro lado, a saída jamais pode ser o fechamento dos espaços com a cobrança de acesso que exclui as pessoas. Muitas outras saídas podem ser pensadas.”
Atualmente, o Brasil possui 74 parques nacionais sob gestão do ICMBio. Desses, sete contam com concessões ativas para a prestação de serviços de apoio à visitação, como cobrança de ingressos, operação de lanchonetes, estacionamento e atividades turísticas. São eles: os Parques Nacionais do Iguaçu (PR), Tijuca (RJ), Serra dos Órgãos (RJ), Itatiaia (RJ/MG), Fernando de Noronha (PE), Pau Brasil (BA) e Chapada dos Veadeiros (GO).
O que o ICMBio diz?
O ICMBio/MMA informa que recebeu a notificação do Ministério Público Federal (MPF) sobre este tema no dia 10/04/2025 e se manifestará dentro do prazo legal.
Informa ainda que o processo está em fase de consulta pública até o dia 17 de maio, aberta a qualquer cidadão que quiser participar ou opinar sobre o assunto. O ICMBio está promovendo ainda diálogos com grupos que se relacionam diretamente com as unidades de conservação (conselhos das unidades, associação de amigos do parque, ciclistas, trilheiros, comunidades do entorno etc.), culminando em audiência pública que será realizada no dia 07 de maio.
Diálogo entre movimentos sociais e ICMBio
No dia 11 de abril, representantes de coletivos e movimentos ambientais reuniram-se com gestores do ICMBio para discutir as reivindicações da sociedade civil. A agenda também contou com a participação dos deputados federais Erika Kokay e Professor Reginaldo Veras, além de assessores dos deputados distritais Gabriel Magno e Fábio Felix.
O encontro foi marcado pelo diálogo em busca de soluções e pela expressão de preocupações com relação à gestão das unidades de conservação, destacando a importância de decisões que considerem a preservação ambiental e o bem-estar das comunidades locais.
Ficou acordado o compromisso de agendar uma audiência com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e com o presidente do ICMBio, Mauro Pires, para tratar do pleito de suspensão do processo de concessão. Também foi proposta a realização de audiências públicas na Câmara dos Deputados e na Câmara Legislativa do DF (CLDF) para ampliar o tema na Casa.
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Fonte ==> Brasil de Fato