“Brasil, mostra a sua cara, quero ver quem paga pra gente ficar assim.” O refrão da música Brasil, de Cazuza — imortalizada na voz de Gal Costa — resume quase à perfeição os últimos acontecimentos políticos no país e a postura da maior emissora de TV diante deles.
Na última semana, com a crise deflagrada pela mudança na alíquota do IOF, vimos o Congresso, sob a liderança do presidente da Câmara, Hugo Motta, agir abertamente para inviabilizar o governo Lula, sob a falácia de “defender os interesses do país”. Quando a crise explodiu após a manobra de Motta, muitos apostaram na derrocada do governo, e a imprensa apressou-se a alardear: “a maior derrota de Lula, que sofre com a queda de popularidade”.
Mas então veio a reação do governo e do PT — e pegou a imprensa de calças curtas. Mais que isso: obrigou-a a expor de que lado sempre esteve: o lado dos grupos de poder, do capital explorador, daqueles que transformaram o Brasil no país mais desigual do mundo. Deflagrada quase imediatamente após o acirramento da crise com o Congresso, a campanha lançada pelo PT dominou as redes sociais com a narrativa central: “Ricos contra pobres.” Vários vídeos explicaram, de forma didática, o absurdo da questão tributária no Brasil, com ricos pagando proporcionalmente muito menos impostos que os pobres, e denunciaram a postura do Congresso em proteger os setores mais poderosos.
A campanha viralizou. A hashtag #CongressoInimigodoPovo ocupou os trending topics do X (antigo Twitter), com mais de 1,5 milhão de menções. Foi uma vitória dupla da esquerda: pela reação rápida e eficaz e pela capacidade de construir uma linguagem clara e acessível, capaz de delimitar o tema e colocá-lo em evidência.
Na edição de quinta-feira do Jornal Nacional, assistimos à queda definitiva da máscara. O telejornal de maior audiência do país fez uma defesa sutil, porém inequívoca, do Congresso, criticando o que chamou de “ataques” e apelando por “moderação” e “convivência democrática”.
Curiosamente, no calor da crise, vários analistas da própria Globo criticaram duramente a ação de Hugo Motta e dos parlamentares, acusando-os de chantagear o governo — como fez Natuza Nery, que chegou a sugerir na GloboNews que Lula se pronunciasse publicamente sobre o absurdo em curso. O que mudou? Talvez a edição do JN tenha servido para mostrar que alguém puxou a orelha dos “garotos e garotas travessos”, lembrando-os de quem realmente financia a festa. O resultado foi uma edição cínica e patética.
Cínica porque se prestou a defender a ação criminosa do Congresso na tentativa de sequestrar o orçamento e inviabilizar o governo Lula. Patética porque, para isso, ressuscitou economistas de credibilidade próxima a zero – como Armínio Fraga, que fez uma fala confusa e recheada de inverdades.
A reportagem, para construir a narrativa de “defesa das instituições”, deu voz quase exclusivamente ao Congresso, alegando que a campanha nas redes sociais “provoca preocupação” e exige “apelos por moderação”. Tentou, a todo custo, reforçar o discurso enganoso da “polarização”. Não foi uma peça longa — pouco mais de seis minutos — nem teve o tom pirotécnico que marcou os tempos da Lava Jato, mas cumpriu um papel sórdido: defender aqueles que sempre lucraram no Brasil.
Há um detalhe curioso, porém: mesmo dando espaço a Hugo Motta e representantes do Centrão, a defesa foi titubeante. Não houve uma mobilização veemente e categórica, como em outros momentos políticos. Isso é um sinal importante. As Organizações Globo não gostam de Lula, e não o querem Lula reeleito em 2026 — fato. Mas também não possuem, hoje, um candidato para chamar de seu, como foram Collor ou Aécio Neves. E sabem, melhor que ninguém, o risco que o bolsonarismo representa para seus negócios (e para a própria sobrevivência), caso um Congresso alinhado à extrema-direita ganhe força.
Não é a primeira vez que a Globo, sob pretextos como “defesa da institucionalidade” e “combate à corrupção”, se insurge contra governos petistas para proteger o status quo do capitalismo selvagem e do deus mercado. Mas, desta vez, ela não liderou a narrativa. Pelo contrário: precisou correr para apagar incêndios, com a campanha do governo já viralizando nas redes. A pressão foi tanta que, segundo o portal NaTelinha, a Globo suspendeu a reexibição da reportagem.
A reportagem do JN, ao defender o indefensável, mostra o susto da mídia com a força da narrativa construída pelo governo — e revela que essa reação segue o rumo certo. E mais: aponta para um potencial eleitoral gigantesco.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
Fonte ==> Casa Branca