A medida provisória que prevê a taxação de fundos hoje isentos — conhecida como MP do IOF — também impõe restrições ao acesso ao seguro-defeso, benefício pago a pescadores artesanais. Em audiência pública nesta quarta-feira (20), representantes da categoria e parlamentares alertaram para o risco de as novas exigências serem uma ameaça à subsistência de milhares de trabalhadores e à autonomia das organizações que os representam.
A principal preocupação recai sobre um artigo da MP 1303/25 que transfere aos municípios a responsabilidade de emitir o registro de pescador artesanal profissional. Atualmente, essa é uma atribuição do Ministério da Pesca. A homologação do documento é requisito obrigatório para a concessão do seguro-defeso (pago durante o período de reprodução das espécies, quando a pesca é proibida).
Outro ponto sensível é a limitação do seguro-defeso à dotação orçamentária aprovada na Lei Orçamentária Anual. Isso significa que, mesmo cumprindo todos os critérios, pescadores poderão ter o benefício negado por falta de recursos.
O Ministério da Pesca e Aquicultura justifica as mudanças como forma de combater fraudes e assegurar que o seguro-defeso seja pago exclusivamente a quem tem direito ao benefício.
Para o presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, a medida representa um risco grave. “Não estamos dizendo que não haja necessidade de filtros, para garantir que a pessoa realmente seja pescadora. Mas adotar uma medida como essa, de transferir a homologação para os municípios, não resolve. Se há irregularidades, que sejam corrigidas, sem penalizar os trabalhadores”, disse.
Na mesma linha, o presidente da Confederação Nacional dos Pescadores e Aquicultores (CNPA), Edivando Soares de Araújo reconheceu a importância do combate às fraudes, mas criticou o texto da MP. “Não devemos pagar pelo erro dos corruptos.”
Diálogo
O secretário-executivo do Ministério da Pesca, Édipo Araújo Cruz, afirmou que o objetivo não é burocratizar o acesso ao benefício, e que a Pasta está aberta ao diálogo. “A MP trouxe duas mudanças principais: a homologação do registro pelo município e o condicionamento do pagamento do benefício à dotação orçamentária prevista. O objetivo não foi burocratizar. O que se pensou foi na proximidade desses atores com as realidades locais e em garantir a sustentabilidade da política”, frisou.
O senador Beto Faro (PT-PA) defendeu a supressão do artigo 71, que transfere a responsabilidade para os municípios. “Essa mudança não vai combater as fraudes, pelo contrário, pode agravá-las. As prefeituras não têm estrutura nem conhecimento técnico para validar registros”, disse.
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) alertou para o risco de a MP enfraquecer a independência das entidades representativas diante de prefeitos e vereadores. “Quem acompanha o dia a dia do pescador são os presidentes de colônias e sindicatos. É esse filtro que deve ser mantido e não um filtro político”, afirmou.
O relator da proposta, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), reconheceu as falhas no sistema atual, mas chamou a atenção para o risco de manter tudo como está. “O seguro-defeso é uma conquista, mas o modelo atual é insustentável. Se não fizermos nada, o problema vai piorar. Meu papel é encontrar uma solução que preserve o benefício e evite fraudes.”
Fonte ==> Camara