3 de novembro de 2025

Mata bandido, beija bandido – 02/11/2025 – Luiz Felipe Pondé

Título – Mata bandido, beija bandido  A ilustração de Ricardo Cammarota foi executada em técnica vetor, preto e cinza sobre fundo branco. Imagem em cor cinza com uma balança central inclinada para a direita.
O prato da esquerda contém o ícone de uma pessoa; o da direita, um ícone de caveira.  Lado esquerdo — “abordagem inteligente” Ícone principal no topo: peça de xadrez tipo peão.
Elementos ao redor: * Olho com o texto “foco em inteligência e investigação” * Texto junto ao prato: “prende líderes e desarticula” * Carimbo com o texto “ação jurídica coordenada” * Tela com gráfico e o texto “uso eficiente de tecnologia e dados” * Torre de transmissão digital com o texto “infiltração e monitoramento” * Ícone de dinheiro cortado com o texto “interrompe fluxo financeiro” * Ramo com o texto “evita mortes”
 Lado direito — “abordagem violenta” Ícone principal no topo: granada Elementos ao redor: * Arma com o texto força e armas * Texto junto ao prato: “mortes sem atingir líderes” * Alvo com o texto “risco alto para civis e policiais” * Explosão com o texto “normalização da letalidade” * Bomba com o texto “comando continua ativo” * Setas circulares com o texto “justiça por vingança” * Escudo circular com o texto “reduz confiança pública”  Na base, abaixo do lado esquerdo: “denúncias sólidas, condenações efetivas”. Na base, abaixo do lado direito: “sociedade passa a aceitar mortes como necessárias”.

Uma mulher sem passagem na polícia pega 14 anos de prisão por pichar com um batom a estátua da Justiça em Brasília. Um assassino de uma mulher sai da cadeia depois de 6 anos e já matou de novo. Aquela mulher do batom demonstrava o sentimento de muitos brasileiros de que a Justiça, no Brasil, nos últimos tempos, não merece mais respeito. O assassino livre é o símbolo do amor aos bandidos que grande parte do Poder Judiciário, por razões ideológicas ou outras quaisquer, tem demonstrado a população brasileira há algum tempo.

Todo mundo sabia que o Estado brasileiro, e, especificamente, o governo Lula, que ama bandidos vítimas sociais, perdeu a soberania para o crime organizado. Enquanto o bravateiro Lula fala de soberania em relação ao Trump, enquanto o STF canta em prosa e verso o Estado de Direito brasileiro, na vida real, fora da “Matrix” em que vive a liderança delinquente do país, o pau come.

O crime organizado tem torcida no Brasil: agentes da Justiça, políticos, artistas, produtores culturais, jornalistas, intelectuais, professores. E o crime sabe bem disso. Aliás, conta com isso como estratégia política e social para construir sua soberania prática sobre o território nacional. Em 20 anos, o Brasil será como esses países do chifre da África em que gangues mandam no território e a população aprende a viver entre balas, roubos, assassinatos cotidianos, e impostos ilegítimos para não serem roubados, estupradas e mortos.

Se a megaoperação carioca teve algum mérito —não vou entrar na discussão técnica porque não sou especialista— foi pôr na ordem do dia o assunto, obrigando a delinquência de Brasília se manifestar. Mas não se iludam: a atenção que o assunto ganhou passará logo porque a mídia tem memória curta, assim como a população em geral.

Outro fator que devemos ter em mente é que o interesse continua sendo eleitoreiro, seja para a direita que, antes da esquerda, tem levado a sério o tema, seja para a esquerda que quer angariar votos entre a enorme população envolvida com aqueles que são do crime ou os seus familiares.

O interesse do governo permanece meramente eleitoreiro. Lula, hoje, venderia o país para qualquer um que garantisse sua eleição em 2026. Não há governo federal e, se houve, acabou. O que há é o quarto mandato. A direita, burra como sempre, não consegue nem se desvencilhar do fator Bolsonaro, presa a uma obsessão que parece ver no ex-presidente uma encarnação do rei português Sebastião causador da nostalgia do sebastianismo que paralisou Portugal. O bolsonarismo hoje é uma forma de sebastianismo.

Chegamos ao ponto de que, para a torcida organizada do crime organizado —repetição proposital— o poder legítimo da violência está migrando para os direitos dos bandidos serem bandidos. Claro, contanto que não invada o Leblon ou a zona oeste paulistana. Soberania é o monopólio legítimo da violência.

É evidente que, para grande parte dessa torcida, o Estado —a polícia, mais especificamente no caso— não merece esse monopólio. Quanto mais policial morrer, e mais bandido escapar, melhor.

Devemos reconhecer que grande parte da perda da fé pública no Estado se dá pelo fato de que um setor significativo da população pobre é vítima de truculência policial, mesmo. Mas mais importante ainda é o fato de que o crime organizado, que está em guerra para tomar o país pra si, já se infiltrou num enorme território das atividades de mercado e do Estado brasileiro.

Agentes públicos de vários setores, assim como agentes econômicos de vários setores, já operam, muito provavelmente, para a rede criminosa. O crime, hoje, mantém todo um serviço de “formação de profissionais” de mercado e de carreira pública para garantir sua tomada de soberania no país. O crime está tão organizado que já tem pauta social.

Mas evidente que porrada só não resolve nada, apesar de que bandido só respeita poder de coerção. A verdade é que ninguém, nem nos setores da administração pública nem no campo acadêmico de especialistas, tem a mínima noção do que fazer.

Entre aqueles que compram um “baseadinho” para recreação e aqueles agentes públicos que há anos —independentes da filiação ideológica ou meramente fisiológicos— ignoram a tomada de soberania no país pelo crime organizado, ninguém está nem aí. Os governos ligaram o “foda-se” há muito tempo para o país, e um dos alvos desse “foda-se” é o fato da população estar cada vez mais aprisionada entre a violência do crime e a do Estado.

Miséria nacional: mesmo a segurança pública está polarizada. A direita mata bandido, a esquerda beija bandido.



Fonte ==> Folha SP

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