As marcas associadas ao agronegócio, mineração ou ao setor de combustíveis representam o principal segmento econômico que, historicamente, aposta na desinformação climática. São setores que, no passado, já negaram a mudança do clima, desacreditam da ciência e atacam ativistas e legislações ambientais.
Em paralelo, esse setor está diretamente envolvido na programação oficial e paralela da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas(COP30) e apresentam projetos com aquele tom “verde” de sustentabilidade que esconde seus principais interesses.
“Isso não é exclusividade do Brasil — todas as COPs têm. Viemos de uma sequência de COPs em países petroleiros. Sabemos que não há dúvida científica sobre o papel dos combustíveis fósseis no aquecimento global. Mas, mesmo assim, as mineradoras, petroleiras e grandes empresas estão aqui — e maquiam a realidade, que é a essência do greenwashing.”, afirma Thaís Lazer, fundadora e diretora da Fala Estudos de Impacto e criadora do Mentira Tem Preço e do Observatório da Integridade da Informação.
Thaís lançou durante a COP30, em Belém, um dossiê chamado Integridade da informação climática – o que fazer para garantir o sucesso da agenda climática?. No documento, ela demonstra que a desinformação dá lucro e envolve uma ampla ‘cadeia produtiva”, conectando quem financia, distribui e amplifica a difusão das informações falsas. Segundo Lazer, esse ecossistema de informações falsas, em especialmente sobre as questões climáticas, gera um custo de US$ 78 bilhões. Os dados são de um estudo da Universidade de Baltimore, publicado em 2019.
“A desinformação climática é criada estrategicamente para minar e adiar soluções. É diferente de uma crítica real — como a falta de espaço para povos indígenas na agenda oficial. Isso é fato. Outra coisa é maquiar trechos e chamar as pessoas para dizer que a COP não resolve nada, com objetivo de destruir seu legado e sua importância global”, analisa a pesquisadora.
Lazer monitorou conteúdos publicados na internet sobre a Conferência do Clima. Ela percebeu, dias antes ao início do evento, um crescimento acelerado de postagens e mensagens que depreciavam a COP no Brasil.
“Nos dois dias anteriores à abertura, foram 8 milhões de visualizações em conteúdos falsos. E por que isso acontece? Para descredibilizar a COP e seus participantes, para atacar politicamente o governo, para desqualificar Belém como cidade sede”, reflete.
“Isso não é desinteressado: existe uma pressão forte da indústria de combustíveis fósseis, do agronegócio e da mineração. Esses atores se aproveitam desses interesses, propagam desinformação e fazem com que a agenda climática e a implementação de políticas públicas sejam atrasadas ou impedidas”, explica Letícia Capone, pesquisadora do Instituto Democracia em Xeque.
Tema entrou na pauta da COP30
Na quarta-feira(12), a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima anunciou a adesão de mais países à Iniciativa Global pela Integralidade da Informação e, pela primeira vez, colocou o tema da desinformação no centro das ações climáticas, como adaptação e mitigação.
“Trazer a integridade da informação para o centro da COP30 é essencial, especialmente porque o Brasil está entre os países mais afetados pelas emergências climáticas.”, reflete Letícia.
Ela recorda que outros organismos internacionais já reconhecem a desinformação como um grave problema.
“Os riscos da desinformação já vêm sendo apontados não só pela literatura e pela academia, mas por organizações multilaterais internacionais ao longo dos últimos anos. O relatório do Fórum Econômico Mundial aponta que a desinformação é um dos maiores riscos para os próximos 10 anos. Então, a gente precisa, de fato, enfrentar essa agenda”.
O foco da iniciativa, agora, a partir da COP, é apoiar os países na elaboração de um arcabouço legal sobre o tema e mobilizar recursos para financiar as atividades.
Para as especialistas, a iniciativa é positiva e coloca em evidência um problema já identificado pela própria Organização das Nações Unidas(ONU).
“A desinformação climática existe para mitigar e adiar soluções. E quando falamos de soluções dentro da COP, estamos falando de modelos de negócio. Por isso digo que o novo negacionismo é econômico — ele serve para atrasar medidas como a transição energética e a transição justa”, defende Thaís Lazer, da Fala Estudo de Impacto.
Thaís também descreve que toda essa cadeia lucrativa da desinformação tem relação direta com problemas climáticos históricos nas comunidades mais vulneráveis.
“Se a população acha que não existe mudança climática, que ainda há tempo, ou que as soluções “não prestam”, ela não cobra políticas públicas. E aí deixam de entrar no debate os impactos das enchentes, escolas fechadas por calor extremo, fumaça, e UBS lotadas por pressão alta.
Brasil na vanguarda
Na quinta-feira(13/11), no Pavilhão Brasil na Zona Verde, foi lançada a Carta Compromisso pela integridade da informação climática na publicidade digital. O anúncio ocorreu durante o painel “Integridade da Informação e Ação Climática no Brasil” e ressaltou o papel da articulação entre governo e sociedade civil para defender um ecossistema de informações mais transparente e preparado para enfrentar a crise climática.
O documento foi apresentado pelo Capítulo Brasileiro da Iniciativa Global pela Integridade da Informação sobre Mudança do Clima, que reúne mais de 130 organizações e conta com apoio do governo federal, da ONU e da UNESCO.
Fonte ==> Brasil de Fato


