Servidores do Estado, incluindo integrantes do Poder Judiciário, são custeados por recursos públicos e estão sujeitos a críticas e questionamentos a respeito de seu trabalho e sua remuneração, desde que baseados em informações corretas. Esse entendimento singelo parece escapar a tribunais do país.
Por uma publicação de julho de 2023 que divulgava valores pagos em abril daquele ano no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS), o jornal Zero Hora e a colunista de política do veículo Rosane de Oliveira foram condenados a pagar a indenização de R$ 600 mil à desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, então presidente da corte.
Nogueira recebeu à época o rendimento líquido de R$ 662.389,16, valor que inclui pagamentos de natureza indenizatória —os infames penduricalhos, por meio dos quais magistrados e outros profissionais da elite do funcionalismo driblam o teto salarial dos servidores, hoje de generosos R$ 46,4 mil mensais.
O valor exorbitante da indenização imposta representa evidente tentativa de desestimular o trabalho da imprensa na fiscalização do poder público, essencial para a democracia.
Na decisão da Justiça estadual, afirma-se que a reportagem criou um “narrativa enviesada e sensacionalista que associava a autora [a desembargadora] à figura de suposto privilégio imoral ou injustificado, fomentando a incompreensão do público leigo”. Note-se que não se mencionam informações erradas no argumento.
Juízes não compõem uma casta isenta de escrutínio. A sociedade tem o direito de tomar conhecimento dos valores que destina ao custeio do Judiciário por meio de impostos, de modo a cotejá-los com o serviço que recebe em troca. Comparações internacionais mostram que o custo do sistema de Justiça no Brasil não tem paralelo entre as principais economias ricas e emergentes.
A despesa com tribunais aqui chega a 1,33% do Produto Interno Bruto, ante uma média de 0,3% do PIB entre 50 países examinados em análise do Tesouro Nacional. A disparidade evidencia salários incompatíveis com a realidade brasileira, dado que cerca de 80% do gasto do Judiciário é destinado a pagamento de pessoal.
Magistrados têm obviamente o direito de reivindicar a remuneração que lhes pareça adequada —embora não o de desrespeitar de modo sorrateiro o limite ora fixado na legislação. Inadmissível, sem dúvida, é que usem seu poder para intimidar veículos de comunicação e profissionais que apenas exercem seu papel de informar com dados públicos.
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Fonte ==> Folha SP