20 de agosto de 2025

A indústria que lucra com o sonho da eterna juventude – 01/07/2025 – Mirian Goldenberg

A imagem apresenta uma sereia estilizada com cabelo vermelho e corpo em tons de amarelo e cinza. Ela está com os braços sobre um fundo azul, com ondas brancas que representam o mar

Quando estive na Alemanha para dar palestras em oito universidades sobre “O Corpo como Capital na Cultura Brasileira”, entrevistei dezenas de mulheres de mais de 50 anos. Depois de uma palestra em Berlim, conversei com um grupo de mulheres sobre a extrema valorização da juventude no Brasil. Contei como ficava feliz quando diziam que eu parecia bem mais jovem do que eu era. Na época, com 50 anos, diziam que eu parecia ter 38. Quanto mais mentiam, mais eu gostava.

Uma pesquisadora alemã me perguntou: “Mirian, por que você acha que aparentar ser mais jovem é um elogio? Você não fica feliz de ser uma mulher interessante, bonita e bem-sucedida aos 50? Por que você quer parecer ser menos do que é?”

Foi como um tapa na minha cara, porque constatei que, apesar de pesquisar há décadas os preconceitos e estigmas que cercam o envelhecimento feminino, eu sofria de “velhofobia”: do pânico de envelhecer. E também reforçava a lógica da dominação masculina que, como mostrou o sociólogo Pierre Bourdieu, exige que os homens sejam superiores às mulheres: mais velhos, mais altos, mais fortes, mais ricos, mais poderosos etc. Portanto, as mulheres devem ser inferiores aos homens: mais jovens, mais magras, mais baixas, mais submissas, mais delicadas etc.

A indústria do rejuvenescimento encontrou no Brasil um mercado de mulheres que têm pânico de envelhecer. Pesquisas mundiais mostram que as brasileiras são as mulheres que mais deixam de trabalhar, de passear, de ir à praia e até mesmo de sair de casa quando se sentem velhas, gordas e feias.

Somos bombardeadas, todos os dias, com as promessas de que podemos ficar “dez anos mais jovem”, ou melhor, “30 anos mais jovem”, como aconteceu com Kris Jenner, de 69 anos, a matriarca do clã Kardashian. Muitas reportagens no Brasil, mostrando o antes e depois de Kris Jenner, afirmaram que ela agora parece irmã de suas filhas, inclusive de Kim Kardashian, de 44 anos. A mudança drástica na sua aparência gerou especulações sobre procedimentos estéticos, incluindo um lifting facial que teria custado mais de US$ 130 mil.

O mercado do rejuvenescimento vive um aumento da demanda no Brasil, mas, infelizmente, pouco se discute sobre os casos de mortes e de vítimas de procedimentos que tiveram resultados desastrosos.

A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) estima que o Brasil realize mais de 1,5 milhão de procedimentos estéticos por ano, reforçando sua posição de destaque no mercado do rejuvenescimento. O Brasil, segundo uma reportagem do Valor Econômico, movimenta R$ 48 bilhões anuais no mercado de estética, com procedimentos faciais ditos não invasivos até terapias mais avançadas, como o uso de inteligência artificial e edição genética para promover o rejuvenescimento celular.

Apesar das pressões do mercado e até mesmo das minhas amigas, nunca fiz qualquer tipo de procedimento para rejuvenescer. Mas confesso que sempre gostei de aparentar ser mais jovem do que sou. Por quê?

Porque a juventude no Brasil é um capital, uma riqueza, especialmente para as mulheres. Quando envelhecemos, perdemos nosso valor, nossa beleza e até mesmo nosso poder. Como escutei de muitas mulheres: “não é nem que fiquei velha, simplesmente deixei de ser mulher, me tornei invisível”. Envelhecer, no Brasil é uma espécie de “morte simbólica”.



Fonte ==> Folha SP

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