9 de setembro de 2025

A vitória da ciência e os riscos que persistem – 08/09/2025 – Opinião

A imagem mostra uma sessão do Supremo Tribunal Federal do Brasil. No centro, há uma mesa com vários juízes e um presidente da sessão, todos em trajes formais. Ao fundo, há uma bandeira do Brasil e um crucifixo na parede. Na frente, há uma plateia com pessoas sentadas, algumas delas com trajes escuros. Em duas telas de projeção, é possível ver informações relacionadas à sessão.

Por 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a constitucionalidade da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) sobre remessas ao exterior. A decisão assegura bilhões ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), evitando uma perda estimada em R$ 19,6 bilhões já neste ano. É uma vitória estratégica para a ciência, garantindo financiamento para pesquisa, inovação e formação de talentos.

Mas a vitória foi apertada e não encerra o debate. Parte dos votos vencidos defendeu restringir a contribuição apenas a contratos com transferência direta de tecnologia, reabrindo espaço para argumentos de escritórios de advocacia e setores empresariais. Esse lobby seguirá ativo, sustentando que a Cide seria um “custo”, quando na realidade é instrumento justo de política de pesquisa e inovação.

Nos EUA, Alemanha, Coreia do Sul e China, tributos sobre remessas internacionais, royalties e propriedade intelectual são práticas consolidadas. Nos EUA, a tributação sobre remessas sustenta parte dos investimentos que levam o país a aplicar mais de 3,5% do PIB em P&D (pesquisa e desenvolvimento). A Alemanha integra esse modelo à sua política industrial de longo prazo, investindo cerca de 3,1% do PIB. A Coreia do Sul usou esses recursos para criar institutos de pesquisa e hoje lidera em esforço relativo, com mais de 4,8% do PIB. A China, além de tributar, vinculou contratos estrangeiros à transferência de conhecimento e à capacitação local, alcançando mais de 2,6% do PIB em P&D e transformando-se, em poucas décadas, em potência tecnológica global.

O Brasil, ao manter a Cide como fonte estável do FNDCT, segue esse caminho. Mas investe ainda apenas 1,2% do PIB em P&D —menos da metade do que investem as nações que lideram a fronteira científica. A retirada ou redução da Cide seria um retrocesso brutal: a perda imediata de bilhões fragilizaria universidades, laboratórios, startups e empresas inovadoras. Isso aumentaria a dependência de tecnologias externas, enfraqueceria a resposta a crises e ampliaria o hiato com economias avançadas.

A contribuição é uma forma justa de equilibrar o jogo: empresas nacionais e multinacionais que pagam por tecnologia externa fortalecem a base científica e tecnológica. Ao contrário do que afirmam opositores, a Cide é investimento que sustenta o próprio mercado brasileiro, criando empregos qualificados, apoiando startups e permitindo que universidades e institutos de pesquisa avancem em áreas estratégicas.

Cada tentativa de reduzir o escopo da Cide ameaça não apenas um ponto técnico do sistema tributário, mas a sobrevivência da ciência nacional. O Brasil não pode depender de recursos eventuais ou vontades políticas passageiras. A estabilidade do FNDCT é indispensável para que o país mantenha a capacidade de inovar, enfrentar desafios ambientais e sociais e afirmar sua soberania no cenário internacional.

Sem ciência, o Brasil perde futuro. Com ciência, transforma conhecimento em desenvolvimento sustentável, competitividade e inclusão.

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Fonte ==> Folha SP

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