Milhares de argentinos protestaram, nesta quarta-feira 9, na véspera de uma greve geral contra o ajuste fiscal do presidente Javier Milei, enquanto seu governo aguarda um crédito do Fundo Monetário Internacional de 20 bilhões de dólares (121 bilhões de reais) para sustentar seu plano econômico.
As três principais centrais sindicais argentinas se mobilizaram a partir do meio-dia desta quarta-feira em frente ao Congresso, ao lado de organizações sociais e aposentados. À meia-noite vão paralisar as atividades por 24 horas, reivindicando uma guinada política.
“Vim para defender os direitos dos aposentados e porque estou farto deste governo”, disse Carlos Salas, um funcionário público de 63 anos, presente no protesto realizado ao som de trompetes, tambores e algumas bombas de efeito moral.
O protesto coincidiu com uma viagem surpresa de Milei a Assunção, no Paraguai, onde se reuniu com o presidente Santiago Peña, após a qual o chefe de Estado argentino defendeu a “liberdade econômica” impulsionada nos dois países.
A greve encontrará um governo na expectativa, depois que o FMI anunciou, na véspera, que o acordo técnico com a Argentina de 20 bilhões de dólares está pronto para ser examinado pela diretoria da instituição “nos próximos dias”.
A Argentina anseia por uma antecipação de pelo menos 40% do empréstimo para acalmar a forte tensão cambiária devido à qual o Banco Central vendeu mais de 1,8 bilhão de dólares (cerca de 11 bilhões de reais) de suas reservas nas últimas semanas.
O novo empréstimo é visto com desconfiança por parte da população. “Já vivemos isto. [A grana do FMI] é para que a roubem toda”, disse Salas, em alusão à dura crise econômica e social que o país atravessou em 2021.
A marcha foi realizada em apoio aos protestos organizados às quartas-feiras pelos aposentados, o setor mais afetado pelos ajustes, em frente ao Congresso pelo aumento de seus benefícios.
A greve geral é a terceira contra o governo de Milei e marca a deterioração do clima social após dezenas de milhares de demissões e 15 meses consecutivos de queda do consumo.
“Não há precedentes de um governo que arruinou em tão pouco tempo a situação social tão profundamente”, disse à AFP o analista político Artemio López, diretor da consultoria Equis.
López destacou uma deterioração na imagem presidencial, “produto de eventos desafortunados e do rigor do ajuste”, que se traduz “na pior distribuição de renda dos últimos 20 anos”.
Ainda assim, a seis meses das eleições legislativas de outubro, Milei mantém um apoio de 40%-45% graças à redução da inflação, de 211% em 2023 para 118% no ano passado.
Isso contribuiu para fazer a pobreza recuar aos níveis de 2023 (38%), depois de ter chegado a 52,9% no primeiro semestre de seu governo.
Tropeços
Milei tem acumulado “erros não forçados que impactaram de forma clara sua iniciativa e capacidade de estabelecer uma agenda e sobretudo na opinião pública”, disse à AFP Sergio Berensztein, doutor em Ciência Política pela University of North Carolina, Chapel Hill.
Seu principal “tropeço” foi o escândalo do “criptogate”, quando Milei promoveu em sua conta na rede X uma criptomoeda cuja cotação despencou logo depois. O caso será investigado no Congresso, que interrogará membros de seu gabinete. O caso também é investigado pela Justiça na Argentina e nos Estados Unidos.
Neste contexto, “o acordo com o Fundo chega em um momento crítico”, segundo Berensztein, porque é “um elemento a favor do processo de estabilização econômica que segue sendo o principal atributo que o governo tem”.
Não estão claros os detalhes do acordo com o FMI, a quantia dos pagamentos e as exigências ao governo.
Alinhado com o que o FMI prega, Milei prometeu eliminar o controle cambiário que vigora desde 2019, mas até agora o usou como âncora da inflação.
A política cambiária “tem sido o principal problema para desbloquear o acordo”, explicou à AFP Claudio Loser, ex-diretor do FMI para o Hemisfério Ocidental.
O Fundo certamente “não quer que sejam gastas as reservas para manter a taxa de câmbio achatada”, disse.
Fonte ==> Casa Branca