Dirigentes de pelo menos oito centrais sindicais se reuniram nesta terça-feira (29) em Brasília, com o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para lhe entregar uma carta de reivindicações do movimento sindical brasileiro. Entre os principais pontos, estão o fim da jornada 6×1, em que o trabalhador descansa apenas um dia na semana, e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. Embora as pautas estejam sob responsabilidade do Congresso Nacional, os dirigentes cobram um envolvimento maior do governo para sua aprovação.
A reunião ocorreu logo após uma plenária e marcha das centrais sindicais na Esplanada dos Ministérios, que culminou com a entrega do mesmo documento ao Legislativo. Segundo as centrais, o ofício é resultado dos debates da nova Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (Conclat), ocorrida em 2022, e já havia sido entregue a Lula durante as eleições daquele ano.
“Primeiro a gente vai agradecer o presidente porque boa parte da pauta que a gente apresentou em 2022 foi encaminhada pelo governo. Mas ainda tem pontos que para nós são muito importantes. São 30 pontos que contemplam a reivindicação dos servidores públicos, dos trabalhadores rurais, das domésticas, dos trabalhadores da indústria”, disse ao Brasil de Fato o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Nobre.
Já Nilza Pereira, representante da Intersindical – Central da Classe Trabalhadora, afirmou ter expectativa de que o governo se envolva mais nas pautas das centrais. “A nossa expectativa é que o presidente possa dar voz à pauta. Ele e o governo têm dado voz à nossa pauta, mas uma voz tímida, porque, como eles mesmos dizem, eles são governo para todos”, afirmou a dirigente.
Fim da jornada 6×1
Um dos focos da conversa entre o presidente e os representantes sindicais na tarde desta terça foi a redução da jornada de trabalho sem diminuição do salário, tema que tem ganhado popularidade no Brasil a partir da discussão sobre o fim da jornada 6×1.
“A gente não quer viver para trabalhar, a gente quer trabalhar para viver. E dessa forma não dá”, disse a presidente da Intersindical, destacando ainda os níveis de dificuldade impostos pela jornada exaustiva, se consideradas outras variáveis. “Para as mulheres é muito mais pesado, porque todo o trabalho da casa, toda educação de filho, todo o cuidado com as pessoas doentes, com os idosos, fica sobre as mulheres e elas também estão submetidas a essa jornada. Então, se é difícil para os homens, é mais difícil para as mulheres. Se a gente fizer um recorte para mulheres é mais pesado ainda. E se a gente for aumentando esses recordes, LGBT, PCD [Pessoas com Deficiência], a gente vai vendo que são essas pessoas com essas características que estão dentro dessa jornada que é desumana”, destacou.
Já o dirigente da CUT tratou de responder aos principais argumentos do setor privado para se opor à proposta. “Ao contrário do que dizem os empresários, a produtividade dos trabalhadores [nos países que acabaram com a jornada 6×1] aumentou. Porque, mais descansados, eles começaram a produzir mais, reduziu o número de acidentes do trabalho, de doença profissional, reduziu o custo da empresas e melhorou muito a qualidade de vida dos trabalhadores. Então, ganhou as empresas, ganhou os trabalhadores e ganhou a sociedade”, disse Nobre.
Nilza Pereira lembra que essa não é uma pauta nova, mas que vem se tornando cada vez mais forte, à medida que aumenta o nível de precarização dos trabalhadores da atualidade. “O presidente [Lula] tem que dizer para os patrões: nós estamos dando grandes benefícios para vocês, isenções fiscais milionárias, então eles precisam entrar com uma contrapartida. Então é hora do governo dizer para eles que a contrapartida é essa. Rosa Luxemburgo disse que era socialismo ou barbárie. Mais do que nunca isso está colocado”, disse a dirigente.
Isenção de IR para que ganha até R$ 5 mil
Outra pauta central da reunião com o chefe do Executivo foi o projeto, elaborado pelo governo e enviado ao Congresso Nacional, que visa isentar o pagamento de Imposto de Renda para trabalhadores com salários de até R$ 5 mil. “Hoje, um trabalhador que ganha R$ 5 mil paga 27,5% de imposto de renda e uma pessoa que tem um rendimento de R$ 1 milhão no ano paga 1,5%. Então nós precisamos de justiça tributária”, disse Nobre.
Para a presidente da Intersindical, o governo precisa entrar de cabeça na articulação pela aprovação da proposta como foi enviada ao parlamento que, por sua vez, já deu sinais de querer alterar parte significativa do projeto. “O governo vai ter que entrar com tudo nessa discussão, porque o Congresso já disse que vai modificar. Eles até concordam da isenção de R$ 5 mil, mas não concordam com a fonte de onde vai vir o dinheiro. Então eles querem devolver o problema ao presidente da República.”
Juros altos
Em declaração ao Brasil de Fato, o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, destacou o papel do Banco Central para o desenvolvimento sustentável da economia brasileira e a ampliação da renda dos trabalhadores.
“Volta a necessidade de uma mudança na política macroeconômica, já que há um contrassenso muito grande para o papel do Banco Central. Nós elegemos o presidente, mas não elegemos nem tampouco demos autonomia ao Banco Central. Portanto, hoje, a missão do BC é de transformar o Brasil num paraíso do rentismo”, disse Araújo, que cobrou a redução da taxa básica de juros, atualmente fixada em 14,25% ao ano.
“Temos um povo que reclama por ter melhores condições para viver, garantir a sua subsistência. Isso pressupõe o quê? Sinalizar uma redução na taxa de juros para que a gente possa estimular o consumo, ofertar crédito e sinalizar a retomada da produção industrial. Isso são pressupostos basilares”, declarou.
Retomada das ruas
Para Nilza Pereira, mais que as reivindicações objetivas, as atividades em Brasília às vésperas do 1º de Maio são um sinal da retomada das ruas por parte das organizações progressistas.
“Todos os movimentos reivindicatórios, todas as ações, todas as lutas foram feitas por um processo de pessoas progressistas. Então é essa a retomada. As centrais, os sindicatos têm tido uma consciência ou têm tentado se ajustar à realidade do século XXI”, afirmou.
“Se não estiver calcada na rua, na consciência do povo, a pauta não anda”, disse Sérgio Nobre. “Todas as vezes que nossa pauta fez sentido para o povo, que o povo foi pra rua e nos apoiou, nós vencemos. Então, a demonstração que foi dada aqui pelos trabalhadores hoje em Brasília é espetacular, porque mostra para a classe trabalhadora qual é o caminho. O caminho é a pressão, a luta, porque nenhum direito que a classe trabalhadora têm hoje, direito de férias, Fundo de Garantia, nada disso veio de graça, veio com muita luta”, destacou o presidente da CUT.
Já a presidente da Intersindical ressalta o afastamento dos sindicatos de suas bases e a necessidade de mudança na estratégia de mobilização e formação dos trabalhadores sindicalizados. “Eu acho que as centrais e os sindicatos perderam muito na formação da nossa classe e acabaram se adequando ao discurso das empresas. Então, tem sindicalista que fala que o trabalhador é colaborador, tem dirigente sindical que assume esse discurso, e isso deseducou nossa classe”, disse Pereira. “Os sindicatos não devem só representar aquilo que é o formal que está na lei, precisam se reinventar.”
Crise no INSS
Os dirigentes sindicais mencionaram ainda a crise no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) como um dos agravantes da precarização dos trabalhadores no atual momento. No entanto, o presidente da CUT disse esperar que as investigações consigam fazer as correções necessárias sem prejudicar a instituição, e chegou a comparar o tratamento dado pela direita e pela mídia alinhada ao mercado financeiro à Operação Lava Jato.
“Na Lava Jato, eles destruíram a imagem da Petrobras, que era um patrimônio do povo brasileiro. Então você investiga. Se tem diretor envolvido, tem pessoa envolvida, você bane da vida pública, vai para a cadeia, mas você tem que preservar a instituição”, disse Nobre.
Na semana passada, uma operação da Polícia Federal, em conjunto com a Controladoria Geral da União (CGU), revelou um esquema de fraude no pagamento de aposentadorias, o que levou à demissão do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e de outros cinco servidores públicos investigados.
Finalmente, o dirigente informou que as centrais se reunirão com autoridades federais para pedir rapidez e transparência nas investigações. “Passado o 1º de Maio, nós vamos pedir uma reunião com o ministro da Justiça, nós vamos pedir uma uma reunião com a com a CGU [Controladoria-Geral da União], com a AGU [Advocacia-Geral da União] e vamos exigir celeridade nessa investigação, porque nós somos maiores interessados em que seja célere a apuração”, afirmou.
Embora evitem declarações públicas nesse sentido, outros dirigentes avaliam que a demissão do atual ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT), poderia ajudar a estancar a crise gerada pela revelação da fraude nas aposentadorias. Outros avaliam que a saída do ministro é improvável, já que ele conta com o apoio de diversos ministros do governo e tem a simpatia do próprio presidente da República.
Além da CUT, da Intersindical e da CTB, participaram da reunião a Força Sindical, União Geral dos Trabalhadores (UGT), a Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) e a Pública Central do Servidor, além de representantes de outras entidades ligadas aos sindicatos.
Fonte ==> Brasil de Fato