Os Estados Unidos vão voltar a exportar os chips H200 da Nvidia para a China, revertendo restrições impostas desde 2022. A decisão de Donald Trump, divulgada no mesmo dia em que o Departamento de Justiça revelou uma operação contra o contrabando desses mesmos chips —avaliados em mais de US$ 160 milhões— pegou legisladores e analistas de segurança americanos de surpresa, mas talvez essa decisão chegue tarde demais.
O H200 representa o que há de mais avançado em semicondutores disponíveis fora das linhas militares. Ele é o motor que alimenta sistemas de inteligência artificial capazes de processar volumes imensos de dados quase instantaneamente.
Cada um desses chips é capaz de realizar trilhões de cálculos por segundo e funciona como a base de modelos de linguagem, carros autônomos e aplicações de defesa, motivo pelo qual sua exportação para a China estava proibida há bastante tempo. A liberação desse produto devolve a Pequim o acesso ao mesmo tipo de tecnologia que os EUA tentaram restringir desde o governo de Joe Biden.
Mas a reação chinesa foi, no mínimo, curiosa ao receber o anúncio com silêncio calculado. Não tardou até que o assessor da Casa Branca para IA, David Sacks, declarasse que a China estaria rejeitando o chip americano por preferir fortalecer sua indústria nacional —sinal claro da confiança de um país que dedicou os últimos três anos a converter sanções em impulso e construiu uma estratégia de soberania tecnológica que mobiliza capital estatal e empresas privadas.
Desde a promulgação da Lei Chips and Science por Biden, Pequim investe somas bilionárias para substituir fornecedores estrangeiros. A chinesa SMIC, impedida de usar as máquinas de litografia mais modernas do Ocidente, adaptou processos antigos e conseguiu produzir chips de 5 nanômetros, algo considerado impossível em 2022.
A conquista representa mais do que um marco técnico. É a prova de que o país aprendeu a inovar dentro das limitações impostas. Essa compressão microscópica aumenta o desempenho sem aumentar o tamanho físico, tornando os processadores mais rápidos e eficientes. É um avanço que redefine o padrão de competitividade em um setor onde cada nanômetro conta.
Ao mesmo tempo, a Huawei consolidou o desenvolvimento de processadores próprios de inteligência artificial, e empresas como a CXMT ampliaram a produção de memórias essenciais para o treinamento de modelos avançados. A política industrial chinesa agora busca não apenas igualar os Estados Unidos, mas eliminar pontos de dependência que possam ser usados como pressão diplomática.
China, terra do meio
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Trump imaginou que vender o H200 garantiria lucro imediato e manteria as empresas chinesas presas ao ecossistema americano. O efeito, porém, parece ter sido o oposto.
A liberação reforçou a percepção de que a China já não precisa da permissão de Washington para avançar. O que o presidente apresentou como vitória comercial pode ser lembrado como o instante em que os Estados Unidos perceberam que talvez não ditem mais as regras nesta seara como costumavam fazer.
Fonte ==> Folha SP

