O maior atrativo de “Indomável“, minissérie em seis episódios que acaba de estrear na Netflix e já figura na primeira posição entre as mais vistas da semana, é sem dúvida a paisagem natural extasiante.
Como todo o restante é correto e eficiente neste drama criminal de “quem-matou”, apreciar as longas tomadas feitas no parque de Yosemite, um dos mais bonitos dos Estados Unidos, pode ser suficiente.
Escrita por Mark L. Smith (de “O Regresso“, que rendeu a Leonardo DiCaprio seu único Oscar, em 2016) com Elle Smith, a minissérie não pretende ser mais que isso —o que não necessariamente é ruim. Entre tantas produções que propõem reinventar a roda da dramaturgia ou exibir virtuosismo, um enigma bem narrado em meio a paisagens naturais impressionantes com personagens razoavelmente complexos pode ser reconfortante.
O crime a ser desvendado é a morte de uma jovem, papel de Ezra Franky, dentro da reserva de Yosemite, um enorme parque natural na Califórnia muito procurado por aventureiros e turistas.
Quando seu corpo despenca repentinamente de um penhasco, o investigador Kyle Turner, personagem de Eric Bana —um dos eternos Hulks do cinema— é convocado a elucidar as circunstâncias. Como é praxe em filmes e séries do gênero, ele terá que fazer seu trabalho com uma parceira que não escolheu e com a qual não se dá, Naya Vasquez, vivida por Lily Santiago, uma jovem policial que trocou os crimes urbanos de Los Angeles pela imensidão de Yosemite ao lado do filho de quatro anos.
Ao mesmo tempo em que Kyle e Naya avançam para descobrir quem está por trás da morte da garota, o espectador é convidado a desvelar mistérios passados da vida dos dois: Kyle perdeu o filho pequeno de forma trágica no próprio parque onde trabalha, e Naya está fugindo do pai de seu rebento, um policial dado à contravenção.
Aos poucos, conforme juntam as peças, os dois percebem que a vítima encontrada no parque tem um papel importante no passado, e que sua morte não está isolada de outros incidentes no parque, para desgosto da administração da reserva.
Bana vai bem no papel de homem atormentado e solitário, um registro bem próximo da escola Clint Eastwood de anti-heróis. Santiago também é uma surpresa feliz na pele da policial ultracompetente mas emocionalmente frágil, imbuindo de sobriedade seu primeiro papel de relevo. Ainda há o veterano Sam Neill, de “Jurassic Park“, como o chefe/mentor de Kyle.
Em meio ao enredo de suspense, “Indomável” cavoca mais do que de costume a vida dos investigadores, dando algumas dimensões a mais ao enigma e impondo uma dúvida sobre até que ponto o profissionalismo pode se dissociar de nossos traumas, ideias pré-concebidas e temores.
Os detetives, afinal, têm seus próprios fantasmas, falhas de caráter e fragilidades para lidar. Isso, por vezes, pode lhes turvar a vista —e é essa possibilidade que a série explora melhor, mais do que o mistério em si, um tanto previsível desde o início.
Como passatempo, os seis episódios de 50 minutos (uma rara produção sem exagero) funcionam bem, ainda que a série seja facilmente esquecível. Para quem se impressionar com as paisagens e o trabalho dos guardas, não deixa de ser irônico o lembrete: na devastação que tem promovido no governo federal nos últimos seis meses, Donald Trump dispensou 25% da força de trabalho dos parques nacionais.
Os seis episódios de ‘Indomável’ estão disponíveis na Netflix
Fonte ==> Folha SP