A retórica do Ministério da Educação contra o ensino a distância (EAD) utiliza premissas que não se sustentam por evidências. Elas são a base da narrativa do ministério para desconstruir a modalidade e moldar a proposta de novas regras. O teor indicado para essa mudança é socialmente perverso e prejudica a sociedade.
As cinco teses defendidas pelo MEC são: 1 – formar professores pelo EAD prejudica a qualidade da educação básica; 2 – o apagão docente na educação básica pode ser resolvido pelo ensino presencial; 3 – alunos do EAD devem estudar por metodologia interacionista; 4 – estudantes de cursos por EAD ou com nota baixa no Enem não devem fazer licenciaturas; e 5 – o MEC deve fechar cursos da saúde, engenharias e licenciaturas 100% online.
A primeira tese, do risco de queda na qualidade da educação básica com docentes egressos do EAD, não se sustenta perante os dados do próprio MEC. O Inep informa nos dados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e do Censo do Ensino Superior de 2005 para cá que a proposição é falsa.
Nas séries Iniciais atuam os pedagogos. O Ideb saiu de 3,8 pontos em 2005 e bateu a meta de qualidade nacional em 2023, com 6 pontos. No mesmo ciclo, a formação em pedagogia por EAD foi de 4,8% em 2005 para 43% dos diplomados em 2023.
A melhoria constante no Ideb, em paralelo à maior formação de professores no EAD, derruba a tese originada pela ONG Todos Pela Educação e adotada pelo MEC.
A segunda tese presume presencialidade como fator de qualidade, e afirma que restringir a formação pelo EAD não traria problemas para a falta de 800 mil professores no apagão docente.
Porém, o Inep mostra que só 829 cidades ofertam licenciatura presencial, contra 3.366 no EAD. O mesmo órgão registra que o apagão é maior em áreas onde somente chegam cursos por EAD. A tese do MEC, que nem traz evidência de prevalência de aprendizagem por maior presencialidade nem se sustenta no campo estatístico, é falha e agrava esse apagão.
A terceira tese, no campo teórico-metodológico, propõe a regra de que alunos do EAD devem estudar segundo modelos de aprendizagem interacionistas, limitados a 50 estudantes em atividade síncrona.
Essa lógica, se encontra aderência no ensino fundamental, não se aplica em teorias de aprendizagem para ensino de adultos na andragogia. E contradiz a opção global de atendimento personalizado, com individuação no suporte. A tese do MEC, portanto, é inválida. Gera custos e retira flexibilidade, sem agregar qualidade.
A quarta tese é socialmente perversa. Tem dupla penalidade: nega acesso às licenciaturas incentivadas pelo MEC à população de 85% dos municípios onde não há cursos presenciais; e pressupõe uma não capacidade de evolução ou de superação a estudantes com score abaixo de 650 pontos no Enem. Segregação social pura.
Por fim, a quinta proposição é nula de partida. O ministro da Educação, Camilo Santana, repete que “vai fechar” ou “proibir” cursos de licenciatura, da saúde ou engenharias 100% online. Porém, em consulta ao MEC, não consta nenhuma autorização de cursos com essa configuração. É, portanto, apenas uma fala retórica, da narrativa contrária ao EAD.
Ao propor um marco regulatório do EAD a partir de premissas inconsistentes o MEC traz 10 consequências negativas para o país:
1 – reduz a Inclusão Social pela educação;
2 – trava a evolução do IDH educacional;
3 – prolonga o apagão docente;
4 – atrasa a melhoria da produtividade na economia;
5 – induz preconceito contra alunos e egressos do EAD;
6 – aumenta custos no ensino público e as mensalidades no ensino privado;
7 – retira cidades, cursos e corta a flexibilidade que tornam o EAD acessível;
8 – produz negacionismo digital, que isola o Brasil perante outros países;
9 – embarga a pesquisa aplicada sobre educação digital;
10. exclui comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas, e também as pequenas e cidades, de cursos superiores.
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Fonte ==> Folha SP