O Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) acaba de publicar “Memórias”, do embaixador Marcos Azambuja (1935-2025). São 368 páginas de longas entrevistas dadas a Gelson Fonseca Jr., Monica Hirst e Alexandra de Mello e Silva.
É uma aula de diplomacia e serviço público, na voz de um diplomata, ex-secretário-geral do Itamaraty, embaixador em Buenos Aires e Paris. Quando os diplomatas rememoram, falam mais de si. Azambuja fala mais de suas ideias e das ideias dos outros. Faz isso com uma certa desembargadorização (palavra que ele usava).
Azambuja foi um grande contador de histórias, engraçado, irreverente e até picante. Nas entrevistas fez poucas concessões à leveza. Tratando de Lula, disse:
“Eu acho que um dia o Lula, como se fosse um rei francês, deverá ser numerado: Lula 1º, Lula 2º, Lula 3º, Lula 4º. O Lula que chegou ao poder é o Lula 5º ou o Lula VI”.
Falando do general João Baptista Figueiredo:
“O fim do governo Figueiredo é um dos momentos mais melancólicos da história do Brasil. Aquele homem fisicamente deteriorado, cercado de pessoas que o manipulam em certa parte. É um Brasil diminuído.”
Sua irreverência impediu que fosse definido como um diplomata de vitrine. Suas memórias revelam o pensador que havia naquele personagem divertido.
Estranho às modas da Casa, via o Brasil à sua maneira:
“Vou tentar resumir tudo o que eu tenho pensado em política externa. Eu acredito que o Brasil tem poder suficiente para participar dos jogos exclusivos de desenho do mundo, mas não tem a capacidade de resistir a essas tendências. Em outras palavras, eu não creio que o Brasil tenha poder suficiente para criar um obstáculo a nada que vá nascer. O que ele tem é capacidade de influência de alguns aspectos daquilo que está nascendo. Portanto, não é de fora, se juntando a um coro que será inócuo, mas sim de dentro, influenciando num bom sentido.”
Em 1982, o governo de Ronald Reagan queria invadir o Suriname.
O Brasil condenou a ideia, se ofereceu para acalmar o ditador local e avisou:
“O Brasil não gosta de tropas na sua fronteira”.
Falando do prazer que teve na embaixada em Paris, matou a pau:
“Na França, quase todo brasileiro vai expressamente para não fazer nada”.
Fonte ==> Folha SP


