Com um nó na garganta, a bailarina, professora de dança e pesquisadora Sylviane Guilherme diz que gostaria de “ter uma trégua e ter mais estabilidade e tempo”. Pois segundo ela que há mais de 20 anos atua na área da dança, viver como mulher artista trabalhadora no Brasil é não ter a perspectiva de estabilidade e continuidade a longo prazo dos trabalhos.

Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Trabalhadora e do Trabalhador, os artistas não são inseridos nas homenagens. Ou seja, a sociedade e o poder público demoraram no Brasil para compreendê-los como trabalhadores e trabalhadoras da cultura. O que, geralmente impacta no olhar, por exemplo, para os direitos trabalhistas e estabilidade dos que se dedicam à arte como profissionais, bem como para a ausência de políticas publicas voltadas ao artista como trabalhador.

Por isso, Sylviane diz que seu sonho é que no Brasil existam políticas que garantam a continuidade de projetos culturais. Pois, o cotidiano dos artistas é correr para escrever projetos que tem pouca duração e baixos cachês, sempre. Além disso, como mulher também no espaço dos coletivos culturais há desvalorização e preconceito.

Em entrevista ao Brasil de Fato Paraná, Sylviane relata contando sua trajetória como é ser uma trabalhadora da cultura.

Confira:

BDF: Conta como começou sua trajetória nas artes

Comecei a fazer aula de dança aos 11 anos de idade em Maringá. Nesse período eu comecei com a dança clássica e logo depois fui experimentar dança moderna, contemporânea, de rua, capoeira. Acabei me encontrando na contemporânea devido a essa possibilidade mais livre, sem tantas amarras e também sem um ideal de corpo, pois saí do padrão por ser uma bailarina sobrepeso. De lá para cá já se foram 35 anos como bailarina e profissional atuo há 20 anos.

BDF: E como vem sendo ser uma trabalhadora das artes

Nesse processo todo como era impossível viver como artista da dança, porque inclusive é a que tem menos fomento, aos 17 anos começo a ser educadora da dança. E, concomitante a este processo, também tenho a minha formação acadêmica.  Inicialmente eu fiz Educação Física e notei que o que me interessava era o movimento estético e fui fazer uma especialização em arte.   Logo depois vim para Curitiba e fiz a Faculdade de Artes, Bacharel em Dança e atualmente faço Doutorado.

E acredito ser importante mencionar minha inserção junto ao MST, fui educadora de artes e dança nos territórios, para o Curso do Pronera e logo depois fui convidada a integrar a equipe de projetos e o Setorial de Cultura.

BDF: Quais os maiores desafios para se manter como uma mulher artista trabalhadora

Eu venho de uma história que não tinha muito o objetivo que eu me transformasse em artista. Venho do interior, de uma família muito simples, meu pai caminhoneiro, minha mãe costureira, ambos camponeses expulsos do campo e foram morar na cidade. Eu e minhas irmãs fomos criadas para sermos exímias donas de casa, de uma geração que pudesse estudar, mas que casasse e tivesse filhos.

Cheguei a me casar, vivi a sobrecarga de ser mulher, dona de casa e ainda bailarina e educadora social. Quando me separei vim sozinha para Curitiba estudar e trabalhar. Então comecei meus corres e fui vendo que sempre foi este o desafio, instabilidade do trabalho de artista e sendo mulher tinha um peso ainda maior.

Além disso, sofrendo os percalços em todos estes ambientes com vários episódios de assédio moral, sendo muitas vezes invisibilizada por homens seja em movimento social, partidos ou coletivos culturais. E, por fim, as aristas vivem sem direitos trabalhistas assegurados, o que é acaba sendo uma forma bem precária.

BDF: Qual teu maior sonho enquanto mulher trabalhadora.

Desejo era ter uma trégua como mulher artista trabalhadora, ter mais estabilidade e segurança. Meu sonho é ter políticas que garantam a continuidade de projetos culturais. Pois, a gente vive de escrever projetos que duram pouco, com cachês baixos e preciso correr em várias frentes. Meu sonho era ter tranqüilidade que as iniciativas que faço parte terão permanência e não precisar fazer vinte coisas para sobreviver. Gostaria de poder conduzir minha força criadora para servir a este processo artístico e também que tivéssemos ambientes de trabalho mais igualitários que eu não precisasse ter esse nó na garganta por ser mulher.