“Transporte público deve ser um direito e não um negócio”, afirma Clauderson Santos, porta-voz do Movimento Tarifa Zero Poços de Caldas. A fala sintetiza o que tem mobilizado moradores da cidade do sul de Minas Gerais: o combate à precarização do transporte coletivo e a construção de um novo modelo de mobilidade urbana que seja gratuito, inclusivo e de qualidade.
Com a atual tarifa de R$ 6,00 — uma das mais caras do Brasil — e a ameaça de aumento para até R$ 8,20, o movimento popular vem organizando manifestações, elaborando propostas e denunciando o que chamam de “descaso por parte da prefeitura”.
No entanto, segundo o movimento, é justamente a tarifa elevada que afasta os usuários, tornando o transporte público menos atrativo que os aplicativos de carona, por exemplo.
Serviço caro e precário
O abaixo-assinado do grupo, que circula na cidade, relata os principais problemas enfrentados pela população: superlotação, frota reduzida, ônibus antigos e sem acessibilidade, horários irregulares e ausência de transporte em fins de semana e feriados.
“Tem ônibus aqui que já devia estar fora de circulação. Muitos não têm estrutura para atender cadeirantes. É um desrespeito com a população”, afirma Clauderson Santos.
A cobrança com base no número de passageiros, e não pela quilometragem rodada, também é criticada. Segundo o movimento, isso encarece ainda mais o serviço, gera lucro para a concessionária e penaliza o usuário.
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Além disso, Santos denuncia que a empresa que venceu a última licitação é, na prática, a mesma que já operava na cidade, e que o Ministério Público de Minas Gerais chegou a questionar o contrato por possíveis irregularidades.
A reportagem do Brasil de Fato MG procurou a prefeitura para esclarecimento das denúncias, mas não recebemos retorno até a publicação desta matéria.
O papel da prefeitura
Segundo o movimento, a gestão do prefeito Paulo Ney (PSDB) tem atuado como “defensora da empresa” nas audiências públicas e justificando os aumentos com base na queda de passageiros. Para Clauderson Santos, falta vontade política para encarar o transporte como um direito.
“Eles dizem que não têm como implementar tarifa zero por causa da dívida da cidade. Mas essa dívida foi criada por eles mesmos. É uma desculpa para não mudar nada”, critica.
O movimento participou de três audiências públicas na Câmara de Vereadores, mas relata que a última foi marcada por exclusão de vozes populares.
“Deram espaço só para um partido e representantes da empresa e da prefeitura. Foi uma audiência que não ouviu o povo”, afirma Santos.
Caminhos para a Tarifa Zero
Inspirado em exemplos como Maricá (RJ), São Caetano do Sul (SP) e cidades da região, como São Lourenço, Três Corações e Machado, o movimento defende a implementação gradual da tarifa zero em Poços de Caldas.
A proposta inclui as mudanças do modelo de contrato com a concessionária; da cobrança por passageiro para quilometragem rodada; além da municipalização do transporte público; financiamento público para subsidiar o sistema; inclusão gradual de estudantes, idosos, pessoas do CadÚnico e em busca de emprego; e participação social nas decisões sobre o transporte.
Segundo levantamento do movimento, o custo anual para viabilizar a tarifa zero seria de cerca de R$ 50 milhões. Metade desse valor já seria arcado pelas empresas privadas que subsidiam o vale-transporte de seus funcionários. Os outros R$ 25 milhões, defende o grupo, poderiam vir do orçamento municipal.
“É só questão de prioridade. Transporte é saúde, educação e trabalho. É o direito de acessar a cidade”, resume Clauderson Santos.
Críticas à exclusão de PCDs
Outro ponto de tensão com a empresa e a prefeitura é o atendimento às pessoas com deficiência (PCDs).
“Eles criaram um sistema separado com vans que buscam na casa. Mas não é inclusão de verdade. As pessoas com deficiência têm que poder andar nos mesmos ônibus, no mesmo sistema, com dignidade. E o agendamento é extremamente demorado e ineficiente”, denuncia.
A luta continua
O Movimento Tarifa Zero acredita que o apoio da população é essencial para pressionar o poder público e avançar na proposta. “A luta é por dignidade. O ‘busão’ de graça é possível e urgente. Precisamos romper a lógica de que transporte é mercadoria. Transporte é direito”, afirma Santos.
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De acordo com o grupo, a cidade enfrenta problemas crescentes com a poluição e escassez de água, e o município poderia se beneficiar com um modelo de mobilidade que incentive o uso do transporte público e reduza os carros nas ruas.
“Tarifa zero também é uma pauta ambiental. E é uma pauta que precisa do povo com a gente”, conclui.
Fonte ==> Brasil de Fato