A semana começou de forma positiva para mim. Recebi do perfil @FotosdoRioAntigo uma imagem rara de Machado de Assis, onde ele está com um grupo de amigos no “terrasse” da Confeitaria Castelões, no centro do Rio de Janeiro.
Trata-se de uma fotografia publicada na revista Fon-Fon, em 1907, intitulada “os nossos instantâneos”, onde aparece o escritor carioca sentado à mesa, com garrafa de vinho e taça, na companhia de José Veríssimo, Euclides da Cunha e Walfrido Ribeiro. A fotografia, que traz a legenda “o aperitivo dos intelectuais”, não é inédita, só pouco conhecida e divulgada. O feliz da imagem, que aumenta a curiosidade, é o fato de Machado ser o único personagem visível na composição do grupo, e estar bem vestido, de óculos, chapéu à cabeça, barba e bigode grisalhos.
Eu fiquei superanimado diante da fotografia de Machado de Assis em outro ambiente que não o normalmente estabelecido universalmente no mundo das letras —com livro nas mãos ou sentado à escrivaninha, em local fechado, lendo ou escrevendo.
A relevação da imagem traz ainda dois novos elementos importantes: ela foi tirada um ano antes da morte do autor de “Memorial de Aires“, aliás romance que havia acabado de ser escrito, e há dois anos do trágico assassinato de Euclides de Cunha —como todos sabem, o autor de “Os Sertões”.
Entusiasmado com a descoberta sobre Machado de Assis, fui vasculhar outros “machadianismos” nas páginas da velha Fon-Fon, uma publicação ilustrada e cheia de ilustres colaboradores, que circulou de 1907 a 1958 —fundada, entre outros, por dois autênticos poetas simbolistas: Lima Campos e Gonzaga Duque.
Vasculhei com tanto afinco que encontrei textos, outras imagens e raras caricaturas que eu não conhecia sobre o “Bruxo do Cosme Velho”: em uma dela, vê-se um Machado com a “farda da Guarda Nacional”. É que a revista repercutia a discussão do “luxuoso projeto” do senador Álvaro Machado criando uma “faixa distintiva” para “uso e gozo” dos presidentes da República. O debate resvalou para um fardão da Academia. A revista revelava que, aproveitando a deixa, o acadêmico Graça Aranha achava difícil por causa da escolha de qual seria o “fardamento”.
Já José Veríssimo, “fundamente patriota”, chegou a propor, caso fosse adotada a vestimenta, a cor “kaki”, como justa homenagem ao Exército, pela derrubada da monarquia brasileira. Aliás, foi o almirante Jaceguay, disciplinado militar, que teve a ideia ainda mais “suntuosa”: propôs uma farda de “pano preto, fechada, com o distintivo em letras de ouro sobre o peito —Academia de Letras“. Está aí, em fins de 1907, o nascimento do fardão usado hoje pelos imortais.
Na cena da Fon-Fon não é possível saber se o nosso imortal Machado de Assis bebia alguma coisa, mas, pela primeira vez, é flagrado de chapéu à cabeça, o que dá mais ineditismo à foto.
Nas descobertas seguintes, realizadas diretamente nas páginas da revista, logo vamos encontra a triste notícia da morte do escritor e a cerimônia no Silogeu, antiga sede da Academia, com a saída do “caixão fúnebre” para o cemitério de São João Batista.
Pode ser que não seja nenhuma novidade essas informações a respeito da revelação da fotografia de Machado de Assis, mas o fato de poder fazer essa revisita à vida de um dos mais importantes escritores brasileiros, para mim, já valeu muito a pena.
Fonte ==> Folha SP