Como explicar que o pedófilo Jeffrey Epstein, o seguro saúde de 24 milhões de americanos e a segurança da aviação nos EUA fazem parte da mesma trama?
Vou tentar. O shutdown do governo federal, que começou no dia 1º de outubro, segue sem sinal de solução. Dependendo do partido de quem responder à pergunta, a paralisação foi provocada por democratas que querem dar atendimento médico gratuito a imigrantes em situação irregular (não querem). Ou a culpa é dos republicanos que tramam deixar expirar o esquema de subsídio ao Obamacare, o seguro saúde privado cujo custo dobra sem a proteção (fato).
O shutdown requer que os controladores de tráfego aéreo trabalhem sem receber salário. O número de voos cancelados está aumentando a cada dia porque mais controladores estão usando os “sick days”, folgas por motivo de saúde. O secretário de Transportes, Sean Duffy, avisou ao público que está preocupado com a deterioração da segurança aérea. O déficit de controladores, antes do shutdown, já era de um quarto da força de trabalho. Com uma jornada média de 60 horas por semana e sem receber o pagamento quinzenal, é de se imaginar o stress da classe.
No longo shutdown de dezembro de 2018 a janeiro de 2019, o cancelamento de voos foi um fator que motivou Donald Trump a negociar com os democratas. Na terça-feira (7), o presidente fez casualmente uma ameaça sinistra, dizendo que não tinha certeza se centenas de milhares de funcionários públicos federais receberiam de volta o salário suspenso. O pagamento atrasado é garantido por uma lei que ele aprovou. No mesmo dia, os detalhes sobre a lei sumiram de um website do governo federal.
Assim, chegamos ao pedófilo e traficante sexual de menores Jeffrey Epstein. O presidente da Câmara, Mike Johnson, decretou um súbito recesso para os deputados em meio ao shutdown. Se a pergunta for feita em off, republicanos confirmam que a folga foi apelidada de “recesso Epstein.”
O líder da Câmara tenta ganhar tempo atrasando a posse de uma deputada democrata que se elegeu no dia 23 de setembro pelo Arizona. Adelita Grijalva vai ocupar a vaga do pai Raúl, que faleceu no meio do mandato, e promete dar o 218º voto decisivo para a liberação de todos os documentos do caso Epstein. Johnson deu posse rápida a deputados republicanos que preencheram vagas de outros defuntos.
Lá Fora
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Depois de fazer campanha defendendo a divulgação do material, o presidente, amigo íntimo de Epstein por mais de uma década, enfrentou a primeira crise com sua base eleitoral, que exige transparência sobre o caso do milionário morto na prisão, em 2019. Johnson nega que esteja bloqueando a posse de Grijalva por pressão da Casa Branca, mas a deputada eleita confirma que o gabinete dele ainda não marcou a data.
Assim, o medo de voar, o medo de perder seguro saúde e o medo da verdade sobre o mais notório criminoso sexual da história do país marcam esta paralisação. Para agravar a tensão, tropas federais fortemente armadas, enviadas para cidades como Washington e Chicago contra a vontade de governantes democratas, também não recebem pagamento durante o shutdown.
E ainda dizem que o Brasil é que não é para iniciantes.
Fonte ==> Folha SP