Os venezuelanos vão sair de casa neste domingo (27) para uma votação dupla. Primeiro para escolher 335 prefeitos e 2.471 vereadores. Depois, os jovens de até 35 anos vão escolher projetos para 5.338 comunas de todo o país na primeira Consulta Popular da Juventude. O governo espera uma mobilização expressiva com esse processo e garantir mais uma vitória expressiva, encerrando um ciclo de um ano de eleições no país.
O chavismo vem em uma sequência de vitórias que consolidou ainda mais o poder do Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV) e sua coalizão de esquerda, o Grande Polo Patriótico. Primeiro, em 28 de julho de 2024, o presidente Nicolás Maduro foi reeleito para um terceiro mandato em uma disputa que foi marcada pelo questionamento dos resultados pela extrema direita.
Depois, em maio de 2025, o grupo liderado por Maduro elegeu governadores em 23 dos 24 estados em disputa no país e conquistou 92% dos deputados da Assembleia Nacional. Agora, a meta é vencer na maioria das cidades para ampliar o domínio territorial e conseguir implementar políticas integradas nas três esferas: nacional, estadual e municipal.
O governo definiu a sua estratégia de maneira clara. Ao colocar uma consulta aos jovens junto com a eleição, o objetivo é mobilizar ainda mais pessoas para um pleito importante e que gire em torno de um projeto encabeçado pelo governo. Apesar de uma vitória contundente no pleito de governadores, a participação foi pequena. Apenas 25% dos venezuelanos foram às urnas. No país, o voto não é obrigatório e, para analistas ouvidos pelo Brasil de Fato, a grande abstenção foi marcada por um desinteresse da população em mais um pleito no país e pelo boicote promovido pela extrema direita.
Desde a posse de Nicolás Maduro em 10 de janeiro, o grupo liderado pela ex-deputada ultraliberal María Corina Machado tem pedido que os eleitores não compareçam às urnas nas eleições seguintes. Isso rachou a direita, já que outros partidos tradicionais como a Ação Democrática e Un Nuevo Tiempo escolheram candidatos, o que facilitou o trabalho do Grande Polo Patriotico nas eleições de governadores.
Agora, a expectativa do governo é ter novamente uma disputa facilitada pela ausência de uma unidade na direita em várias cidades.
A estratégia usada pelo governo durante a campanha foi a mesma das eleições para governos. O PSUV não fez grandes marchas e não adotou uma campanha visual com cartazes, santinhos e propagandas televisivas. A aposta do grupo de esquerda foi passar de casa em casa nas menores cidades, usando uma estruturada capilarizada que o partido construiu.
Para o cientista político Sair Sira, esse dilema das oposições não favorece as instituições democráticas, mas acaba beneficiando quem decidiu inscrever candidatos, que, neste caso, é o PSUV.
“O PSUV tem uma estrutura que não funciona só como partido de quadros e formação ideológica, mas que tem uma estrutura de massas e consegue chegar às ruas e casas. Isso dentro da engenharia eleitoral dá uma vantagem. A organização e a disciplina partidária de mobilização é algo que tem o partido socialista, que já parte com essa vantagem” disse ao Brasil de Fato.
A oposição, no entanto, não abre mão do domínio político já estabelecido, especialmente nas zonas mais ricas. Chacao, Baruta e Lechería são três das cidades com maior concentração de renda da Venezuela e hoje são administradas por políticos de direita. Opositores entendem que essas cidades são redutos eleitorais da direita que não podem ser perdidos porque é onde está o poder político e as maiores cidades do país em termos demográficos.
Comunas e as eleições
A consulta também é lida como estratégica para o governo iniciar jovens na política. Pessoas de 15 a 17 anos poderão votar por um projeto entre os 7 escolhidos em cada comuna. A lógica é a mesma das consultas populares que são realizadas pelo governo desde o ano passado. O projeto vencedor receberá US$ 10 mil (R$ 56 mil) para ser executado.
Para o governo, a meta é transferir o poder para as comunas. As comunas são uma nova forma de organização social baseada na autogestão e com diálogo permanente com o Estado. Elas, inclusive, têm prioridade na transferência de recursos e não precisam ficar restritas a um Estado ou município, ou seja: uma mesma comuna pode abranger mais de uma cidade.
A ideia das comunas foi projetada durante o governo de Hugo Chávez. A meta do ex-mandatário era formar um Estado Comunal, que seria a gestão do Estado por uma Federação Comunera, uma estrutura que reúne as comunas do país. O objetivo é que o governo seja administrado de baixo para cima, no qual a decisão dos conselhos comunais teriam peso na decisão coletiva da Federação.
As consultas populares têm sido hoje a principal ferramenta de mobilização das comunas e apresentam uma outra vantagem para o PSUV em meio a eleições para prefeitos. Por terem sido concebidas pelo ex-presidente, as comunas venezuelanas têm hoje uma proximidade maior com os debates da esquerda e tendem a ser o epicentro da militância chavista na Venezuela.
Sair Sira entende que essa eleição marcará também uma disputa interna na chamada Revolução Bolivariana entre os prefeitos e governadores e as próprias comunas. Para ele, esse ciclo eleitoral será o primeiro processo em que prefeitos e governadores vão assumir tendo que lidar com um aumento cada vez maior das comunas e, muitos deles não querem perder seus espaços de comando.
“Eles serão os primeiros prefeitos e governadores que terão um mandato pautado em um trabalho direto com as comunas. Trabalho direto não é em uma relação de subordinação que em algum momento se viu, mas lidando com projetos comunais que devem receber financiamento, gostem ou não os prefeitos”, afirma.
Fonte ==> Brasil de Fato