É um erro afirmar que a defesa do artigo 19 do Marco Civil da Internet é só uma causa bolsonarista ou mero alinhamento a interesses financeiros das big techs.
Afinal, é grande a parcela de liberais e democratas, de direita e de esquerda, que discordam tanto do ex-presidente e do modelo de negócios dessas empresas como da tentativa de tornar inconstitucional esse dispositivo.
Além de equivocada, tal ilação é perigosa porque incita a polarização ideológica, ao moralizar e politizar um tema que deveria ser abordado de modo mais sensato.
O apoio ao artigo 19 se dá, principalmente, a partir do chamado argumento de princípio, que, num debate de ideias, é aquele que parte de normas ou valores universais (liberdade, autonomia, igualdade etc.), tende a ser mais abstrato e menos dependente de casos específicos e pode ser usado para criticar medidas que, mesmo sendo eficazes, violem princípios fundamentais.
O artigo 19 estabelece que as plataformas online só podem ser responsabilizadas pelo conteúdo postado por usuários se desobedecerem ordem judicial para a retirada desse material —exceto em casos de violação de direitos autorais e imagens de nudez não consentidas, nos quais bastam denúncias de usuários.
Quem o defende, baseia-se no princípio da liberdade de expressão, segundo o qual opiniões impopulares, mesmo odiosas, são protegidas. As situações que se enquadram em infrações legais, como calúnia ou racismo, precisam ser avaliadas pela Justiça para impedir censura generalizada e imputação de crimes a inocentes. Ressalte-se, assim, que não se trata de liberdade absoluta.
Respaldo similar deu o ministro André Mendonça em seu voto a favor da constitucionalidade do artigo, durante julgamento no STF. Foi voz dissonante ante os três ministros que já votaram.
Ou seja, não importa se bolsonaristas ou big techs aprovam o dispositivo. O que está em jogo é um dos pilares que sustentam o edifício democrático, a liberdade de expressão, e por isso é preciso cautela ao movê-lo. Mas não é o que se tem visto num STF ativista e no debate público polarizado.
Fonte ==> Folha SP